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Adiar não tornará mais simples a gestão de resíduos sólidos

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Adiar não tornará mais simples a gestão de resíduos sólidos

São muitos os setores da economia e das políticas públicas com impactos estruturantes para o desenvolvimento de sociedades. E algumas atividades, tal como o titã Atlas, da mitologia grega, têm o papel de dar suporte civilizatório. É o caso do saneamento básico e da coleta e destinação de resíduos.

Por ser uma área estruturante para o desenvolvimento de uma economia verde e sustentável, o IDS (Instituto Democracia e Sustentabilidade) e o IEA (Instituto de Estudos Avançados da USP) abraçaram o tema na iniciativa de Diálogos Setoriais por uma Economia Verde e Sustentável. No final de novembro/2024 foram reunidos especialistas para apoiar a troca de informações sobre gestão de resíduos sólidos e saneamento sob o prisma dos conceitos da Economia Circular, bioeconomia e produção de adubos e gases energéticos

Estiveram presentes:

  • Gabriel Medes Mariano – Analista ambiental da área de Gestão de Resíduos do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima.
  • Gina Rizpah Besen – Pesquisadora Colaboradora do Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo.
  • Maíra Pereira – Diretora da Ambipar Environment e Co-fundadora da Tecnologia Social de Logística Reversa.
  • Severino Lima Jr.  – Presidente da Aliança Internacional de Catadores de Resíduos e atua no Movimento Nacional de Catadores.
  • Mediação: Ricardo Young – presidente do Instituto Democracia e Sustentabilidade.

Algumas questões importantes para a gestão de resíduos e o desenvolvimento de uma real economia circular foram postas de maneira muito incisiva pela pesquisadora Rizpah Besen e pelo presidente da Aliança Internacional de Catadores, Severino Lima. E a executiva da Ambipar, Maira Pereira, mostrou que além dos sistemas públicos, a iniciativa privada pode ter um papel na organização de sistemas de logística reversa, inclusive com a participação de cooperativas de catadores apoiadas pela empresa. O representante do Ministério do Meio Ambiente e Mudanças do Clima, Gabriel Medes Mariano, apresentou alguns números preocupantes do setor, onde apenas 4% dos resíduos recicláveis entram em processos de logística reversa.

Mariano aponta que os municípios com mais problemas para implantar sistemas de coleta seletiva e aterros sanitários são, em maioria, aqueles que não estabelecem nenhum tipo de cobrança pelos serviços públicos de limpeza urbana. Ele alerta que a imposição de tarifas nessa área é muito impopular, por isso muitos prefeitos se recusam a aplicar. Ele também aponta que apenas 1.630 municípios têm sistemas de coleta seletiva, enquanto 3.430 não têm o sistema em operação. Os melhores números estão nas regiões Sul e Sudeste, enquanto os piores estão nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. “O Brasil precisa encontrar modelos que permitam aos municípios menores, que têm problemas de capacitação e recursos humanos e financeiros, criar sistemas de logística reversa e inclusão na economia circular”, diz.

Encontro ocorreu no dia 27 de novembro. Imagem: IDS.

Um ponto central de uma economia circular funcional é que os resíduos precisam ser trabalhados para ter o melhor aproveitamento possível. Isso, segundo a pesquisadora Gina Rizpah, significa que não apenas os recicláveis precisam ser trabalhados para um retorno eficaz aos sistemas de produção, mas também os resíduos orgânicos, que têm um enorme potencial de biotransformação em produção de gás e adubos que, se destinados à agricultura, resultaria em uma enorme economia. Ela faz questão de pontuar que é uma falácia apontar a incineração como uma destinação segura. “Seria queimar toneladas de resíduos valiosos para jogar milhões de toneladas de carbono na atmosfera”, diz Rizpah, uma das mais tituladas especialistas no assunto.

Para Maira Pereira, diretora da Ambipar, empresa com atuação abrangente na área de gestão ambiental, a economia circular precisa de sistemas de logística reversa eficazes e que garantam que materiais com valor para a indústria sejam triados com qualidade e reinseridos nas cadeias de valor dos sistemas de produção. Ela tem uma forte atuação na criação de modelos de gestão de cooperativas de catadores com foco não apenas no processo econômico, mas também na valorização dos trabalhadores, em uma relação humanizada em todo o processo. Para Maira, não há soluções únicas para o fortalecimento da economia circular. “Será preciso estabelecer um processo de valorização do trabalho dos catadores como prestadores de serviços ambientais dentro de parâmetros de remuneração justa”, explica. “Mesmo que prefeituras e empresas sejam reativas a isso, não há outro caminho, assim como a logística de resíduos deve ser tratada como um processo econômico importante no sistema produtivo”, pontua.

Severino Lima Jr, representante dos catadores, aponta que um dos problemas para o setor é que as empresas e organizações sociais, em sua maioria, quando vão apoiar os catadores assumem um papel de tutela, ao invés de criar sistemas de capacitação que permitam aos catadores fazer a gestão de suas cooperativas. “Temos casos em que essa tutela já tem mais de 10 anos, o que não pode ser considerado um apoio, mas sim uma usurpação de função”, explica. Para ele, o catador é o elo mais importante de um sistema de economia circular, não há nenhum processo de logística reversa que possa prescindir do apoio dos catadores.

Ele reforça que são importantes o apoio e a capacitação técnica oferecida por entes públicos, privados ou organizações sociais, mas sem o caráter de tutela, mas dentro de uma lógica em que prevaleça a autonomia das organizações de catadores. Ele dá o exemplo de programas de pagamento por serviços ambientais que têm muita resistência em alguns estados, mas que funcionam muito bem em Minas Gerais e que já estão sendo organizados no Ceará. “Tem muito dinheiro circulando em sistemas de logística de resíduos, o problema é que não chega na ponta dos catadores”, explica, apontando a existência de uma grande cadeia de intermediários.

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