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ONGs criticam relatório do Estatuto do Pantanal e pedem alterações pela proteção do bioma

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ONGs criticam relatório do Estatuto do Pantanal e pedem alterações pela proteção do bioma

As ONGs ambientais WWF-Brasil, SOS Pantanal, Environmental Justice Foundation e Chalana Esperança cobraram, em nota técnica, que o Estatuto do Pantanal (PL 5482/20) trate de forma mais específica sobre as singularidades e necessidades do bioma. O relatório do senador Jayme Campos (UNIÃO-MT) sobre a proposta legislativa, aprovado na Comissão de Meio Ambiente do Senado na última quinta-feira (4), é “genérico” e “não atende à necessidade de se ter uma lei especial para o bioma, muito menos assegura a sua devida proteção”, avaliam as organizações.

O documento critica a retirada de trechos tratados como importantes para a sustentabilidade do bioma, como as referências à proteção da Bacia do Alto Paraguai – que se estende além do Pantanal e é onde nascem boa parte dos rios que percorrem a região – e à proibição de uso do fogo durante o período seco. 

O relatório de Jayme Campos chegou a rejeitar uma emenda do senador Alessandro Vieira (MDB-SE) que tratava da proteção de toda a bacia, alegando que “a futura norma limita-se ao espaço geográfico compreendido pelo bioma Pantanal”. 

Para as organizações, sem atenção a toda a região, “o Pantanal secará completamente e as queimadas se intensificarão cada vez mais.”

A proposta inicial é do senador Wellington Fagundes (PL-MT) e foi apresentada em dezembro de 2020. Para o relator da proposta, as supressões feitas agora no texto original foram necessárias para que “Estados e Municípios possam legislar sobre a matéria”. Isto é, segundo seu entendimento, da forma como estava o texto, estados e municípios inseridos no bioma perderiam a autonomia para legislar sobre ele.

A nota técnica das organizações não-governamentais, porém, alega que uma lei que efetivamente conserve o bioma precisa, ao menos, federalizar normas estaduais, como a de proibição de barragens e do uso intensivo do solo, como ocorre na planície do Pantanal Mato-Grossense. Como já demonstrou a SOS Pantanal, uma das ONGs que assinam a nota, as leis estaduais de Mato Grosso protegem muito mais o bioma do que o arcabouço legal de Mato Grosso do Sul, por exemplo.

As organizações também defendem que o projeto deve abranger toda a Bacia do Alto Paraguai, prever a restauração das nascentes e conter planos específicos de manejo do fogo. A proposta, da forma como está, é “o início de um texto que pode vir a ser adequado para assegurar a preservação do Pantanal”, diz um trecho do texto. Mas, para cumprir integralmente essa função, ele precisaria ser aprimorado para proteger a dinâmica hídrica e a biodiversidade do bioma.

Pela natureza do projeto, ele não precisa passar por votação no Plenário do Senado, podendo ir direto para a Câmara. A votação só acontecerá caso algum senador apresente requerimento para tal.

A tramitação do Estatuto do Pantanal acontece em meio à pressão do Supremo Tribunal Federal (STF). Em julgamento no início do mês passado, a maioria da corte acompanhou o voto do ministro André Mendonça – relator da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 63, movida pela Procuradoria-Geral da República (PGR) em 2021 –, determinando que o Congresso edite lei específica sobre o Pantanal no prazo de 18 meses.

Principais preocupações sobre o relatório

Além dos pontos já citados, o documento aponta como prejudicial ao bioma a retirada da previsão de garantia dos direitos territoriais dos povos indígenas e tradicionais, como constava no texto original do projeto.

“O Pantanal possui áreas de proteção e de usufruto de comunidades tradicionais e povos indígenas já muito aquém do justo e adequado, comparado com todo o território pantaneiro, que têm 90% da sua área sob domínio privado. Portanto, a supressão desses dispositivos enfraquece e traz insegurança jurídica sobre o uso de recursos locais que esses grupos produzem e utilizam”, critica o texto.

As organizações pedem que o projeto de lei reforce a necessidade da “participação e respeito à vontade das populações impactadas por qualquer projeto de infraestrutura pensado para a Região”.

A nota aponta também para a necessidade de criação, prevista no texto da lei, de novas unidades de conservação no bioma, assim como a ampliação das já existentes, seja na Planície Pantaneira ou no planalto que a cerca, região onde nascem os rios. 

“O índice pluviométrico da Planície Pantaneira é baixíssimo, cerca de 1.100mm por ano. São os recursos hídricos que deságuam na planície, vindos do planalto, que geram as peculiaridades de alagamento e biodiversidade do bioma. A região das cabeceiras, entretanto, está, em sua grande maioria, ocupada pela produção agropecuária”, aponta a nota.

Outro trecho do texto diz que “a necessidade de preservação e cuidado do planalto é de suma importância para a manutenção das características ecológicas da Planície Pantaneira, visto que uma vez interrompido o fluxo hídrico para a parte baixa, o Pantanal sofrerá intensa seca e degradação como consequência direta; condição, inclusive, já observada”. Como mostrou um estudo divulgado na semana passada pelo WWF-Brasil, outra organização que assina a nota, o Pantanal sequer teve cheia em 2024 – o nível do rio Paraguai esteve 68% abaixo do esperado nos 5 primeiros meses do ano.

“Atualmente, a agropecuária intensiva já ocorre no Planalto Pantaneiro e seus impactos são imensos na planície. Diante disso, a proibição de uso intensivo do solo deve ser total, como preconiza as leis estaduais, tanto na planície, quanto no planalto. A título explicativo, 55 milhões de litros de pesticidas são usados na Bacia do Alto Paraguai e se as tendências atuais continuarem, o uso pode aumentar em até 7,7% até 2050”, afirma o documento, que cita ainda a detecção de mercúrio em onças, o que indica a contaminação dos rios do bioma, onde elas capturam peixes e jacarés.

Além disso, o texto pede que se inclua a previsão de implementação de corredores de biodiversidade, a compensação ambiental de áreas desmatadas e a promoção de “instrumentos econômicos na gestão do Pantanal”, como o pagamento por serviços ambientais, “visando fomentar a sustentabilidade socioeconômica e ambiental do bioma, priorizando o atendimento a comunidades tradicionais, populações indígenas e fazendeiros tradicionais”.

Para as organizações que assinam a nota técnica, o relatório aprovado pelos senadores faz apenas discussões de princípos sobre aquilo que o Estado deve seguir para aplicar políticas ao bioma, mas não possui dispositivos capazes de concretizar esses princípios. 

“O Congresso Nacional carrega o dever de construir uma legislação robusta que assegure a proteção da maior área úmida tropical do planeta, liderando o compromisso nacional com a proteção ao Pantanal, em cooperação com todos os entes públicos e privados, e atendendo também a demandas globais de proteção do clima e da biodiversidade”, destaca o documento.