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Ataques a retomadas indígenas deixam feridos e cercos que impedem socorro

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Ataques a retomadas indígenas deixam feridos e cercos que impedem socorro

Desde a última semana, ataques de homens armados contra indígenas em Mato Grosso do Sul, Paraná e Rio Grande do Sul deixaram feridos – sendo três baleados, quatro atropelados e outros agredidos –, casas queimadas e veículos destruídos. A denúncia foi feita pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi). O governo federal, por meio do Ministério dos Povos Indígenas (MPI) e da FUNAI, anunciou o envio de equipes para “mediar conflitos”. Organizações indígenas e o MPI colocam os ataques no contexto de tensões geradas pelo Marco Temporal.

Os atentados foram cometidos em retomadas – áreas reivindicadas como território tradicional pelos indígenas, mas cujo processo de demarcação está, na maioria das vezes, emperrado e disputado por terceiros, como fazendeiros. No caso da Retomada Fág Nór, do povo Kaingang, em Pontão (RS), a área sequer é propriedade privada, mas sim pertencente ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), segundo o Cimi. “Os Kaingang não ocupam terra privada, mas apesar disso são atacados”, ressalta a organização indigenista.

Segundo os comunicados do MPI e da Funai, foram enviadas, a partir desta terça (16), missões para mediação de conflitos fundiários após os ataques, em conjunto com o Ministério dos Direitos Humanos. As equipes se deslocaram inicialmente para as áreas de conflito em Mato Grosso do Sul e no Paraná – onde a atuação recebe o apoio da Força Nacional, da Polícia Militar do Paraná e do batalhão de polícia de fronteira do estado. Segundo o MPI, “um contexto de conflito do Rio Grande do Sul também vem sendo monitorado e acompanhado”.

Procurado, o Ministério da Justiça e Segurança Pública afirmou, em nota (íntegra abaixo), que o ministro Ricardo Lewandowski “determinou a atuação da Força Nacional de Segurança Pública (Força Nacional) nos territórios indígenas que estão em situação de conflito” nos três estados, para proteção dos indígenas e para apoiar as operações conduzidas pelo Ministério dos Povos Indígenas. Segundo o ministério, a força já vinha atuando nas Terras Indígenas Nonoai, Cacique Doble e Passo Grande do Rio Forquilha, no Rio Grande do Sul, e para proteção dos povos Avá Guarani, no Paraná – que, ainda assim, também foram vítimas dos ataques.

Rio Grande do Sul

Os primeiros ataques aconteceram na quarta-feira (9), contra a Retomada Fág Nor. Ainda no segundo dia da ocupação, iniciada na terça, pessoas não identificadas passaram pela estrada e atiraram contra os barracos dos indígenas. Já na madrugada de domingo (14), homens armados novamente invadiram o local e atearam fogo a um veículo da comunidade, segundo a denúncia do Cimi.

Já no sábado, em Eldorado do Sul (RS), a comunidade Pekuruty, do povo Guarani Mbya, também foi vítima de disparos de arma de fogo contra seu acampamento, às margens da rodovia BR-290. Uma pessoa não identificada parou no acostamento, disparou contra os indígenas e saiu em disparada. Ninguém se feriu. Os indígenas acampados tiveram sua aldeia destruída por ação do DNIT, como denunciaram no início de maio, enquanto estavam em abrigos devido às enchentes que atingiram o estado.

Procurada para saber se providências estão sendo tomadas em nível estadual para proteção dos indígenas, a Secretaria de Segurança Pública (SSP) do Rio Grande do Sul afirmou apenas que “para tratar desse assunto, você deve contatar a Polícia Federal, que é o órgão responsável por tratar de questões relacionadas a terras indígenas”.

Paraná

Também no sábado (13), mas no Paraná, os ataques aconteceram próximos à Terra Indígena Tekoha Guasu Guavirá, entre as cidades de Guaíra e Terra Roxa, na fronteira com o Paraguai. No início deste mês, indígenas Avá Guarani iniciaram a retomada dos territórios Arakoé e Arapoty, na região da TI. Fazendeiros locais invadiram a região de Arapoty atirando contra as famílias e queimando barracos e alimentos, narrou o Cimi. Segundo o MPI, um indígena foi baleado no ataque. 

Ainda na manhã daquele sábado, um missionário do Cimi que se encaminhava à retomada foi ameaçado e perseguido por homens armados, mas conseguiu escapar. Já nesta segunda-feira (15), fazendeiros cercaram a comunidade e atropelaram quatro indígenas. Segundo o Cimi, os agressores cercaram a retomada e fizeram um bloqueio, impedindo a entrada de ambulâncias do Samu e condicionando a abertura do cerco à saída dos indígenas do local.

Procurada, a Secretaria de Segurança Pública (SESP) do Paraná enviou comunicado em que foi anunciado o reforço do policiamento no município de Terra Roxa, onde aconteceu a retomada – tratada pela secretaria como “invasão”. O texto diz ainda que o secretário Hudson Leôncio Teixeira faria reuniões com “representantes da Funai, Incra, Justiça Federal, Polícia Federal, Batalhão de Fronteira, Prefeitura de Terra Roxa, Ministério Público, sociedade civil e outros órgãos que estão debruçados na questão” nesta quarta (17).

Segundo apurado pelo g1, ficou definida na reunião a criação de um grupo de trabalho para mediação de conflitos. Esse grupo sugeriria a compra de uma área pela Itaipu Binacional para realocação dos indígenas, que tiveram parte de seu território alagado pela hidrelétrica. “A compra dessa área pela Itaipu é a solução mais rápida e inteligente no momento. Resolve o problema de todo mundo. Se formos esperar pela via judicial, vai demorar muito”, disse o secretário Teixeira.

Mato Grosso do Sul

No estado, os ataques começaram na tarde de domingo (14), quando grupos de fazendeiros armados atacaram uma retomada Guarani Kaiowá, na Terra Indígena Panambi-Lagoa Rica, em Douradina (MS) – que está com seu processo de demarcação suspenso judicialmente. Segundo nota da Aty Guasu, assembleia-geral dos povos Guarani e Kaiowá, os fazendeiros invadiram a região da TI, e um indígena foi baleado na comunidade Guyrakamby’i. Ataques também ocorreram nas comunidades Itay, Gaaro’ka e Tajasu Iguá, que compõem o território.

Já na manhã de segunda-feira (15), como narra o Cimi, indígenas Guarani Kaiowá que retomavam parte de outro território com demarcação estagnada, a TI Dourados-Amambaipeguá I, em Caarapó (MS), também foram atacados. Um grupo armado invadiu o local e atirou contra os indígenas, atingindo uma jovem na perna. Ela ficou sem atendimento médico, segundo a organização.

“Eles estão atirando para matar e prometendo um massacre. Estamos pedindo, urgentemente, socorro. Lembramos que em 2015, estes mesmos grupos de fazendeiros já atacaram a comunidade de Guyrakamby’i, e que só não cometeram uma chacina porque o Ministério Público Federal (MPF) impediu. Solicitamos urgente ajuda e que o Estado garanta nossa segurança, pois estamos em nosso território ancestral”, diz trecho da nota da Aty Guasu.

Procurada para responder sobre eventuais medidas em conjunto com os órgãos federais para proteção dos indígenas, a Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (SEJUSP) de Mato Grosso do Sul não retornou o contato.

Íntegra da resposta do Ministério da Justiça e Segurança Pública

O ministro da Justiça e Segurança Pública determinou a atuação da Força Nacional de Segurança Pública (Força Nacional) nos territórios indígenas que estão em situação de conflito no Rio Grande do Sul, Paraná e Mato Grosso do Sul. A atuação da Força é direcionada para proteção dos indígenas e para dar apoio às operações do Ministério dos Povos Indígenas (MPI) nos territórios.

Portarias estão vigentes para Nonoai, Cacique Doble e Terra Indígena Passo Grande do Rio Forquilha, no RS. No PR, está vigente, até o início de agosto, a portaria para proteção dos povos Avá-Guarani, em Guaíra.

Ontem, o ministro também determinou a atuação da Força Nacional para segurança e apoio das operações da Funai nas terras que estão em situação de conflito em MS.

Mais informações podem ser obtidas junto à Funai e o MPI.