A briga para ver quem manda no Alto Corcovado, mais especificamente na área onde foi erguido o Cristo Redentor, no Rio de Janeiro, não é nova. De um lado, o ICMBio, órgão ambiental responsável pela gestão das unidades de conservação federais, entre elas o Parque Nacional da Tijuca, onde está o monumento. Do outro, a Mitra Arquiepiscopal do Rio de Janeiro, responsável pela gestão dos templos católicos da cidade, entre eles a capela aos pés da estátua. A queda de braço, que inclui dois projetos de lei para desafetação da área e transferência para igreja, chegou ao Palácio do Planalto, com um apelo ao vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) para que interceda em favor da arquidiocese.
Em carta enviada pela Mitra em agosto de 2024 e obtida por ((o))eco via Lei de Acesso à Informação, a arquidiocese pede ao vice-presidente – ele próprio católico declarado – que “interceda pela Mitra Arquiepiscopal do Rio de janeiro para que se encontre uma solução capaz de desafetar a área conhecida como Alto Corcovado através da redefinição dos limites da Unidade de Conservação, mais precisamente a partir do seu estacionamento até o platô superior onde se encontra o Cristo Redentor”.
O documento afirma que a Mitra foi “sendo escanteada” pela gestão da unidade de conservação, criada em 1961, e critica a falta de modernização e devida manutenção do platô edificado onde está o monumento, assim como a falta de preparo para receber pessoas portadoras de necessidades especiais. Hoje o único equipamento de apoio ao acesso da base do Cristo são escadas rolantes. Elevadores levam apenas até uma base inferior.
Em dezembro, com a renovação dos contratos com as concessionárias Trem do Corcovado e Paineiras-Corcovado, responsáveis pelos serviços de transporte e atendimento ao turista no monumento, foram anunciados investimentos de R$ 25 milhões anuais pelos próximos três anos no Parque Nacional da Tijuca. Estão previstas obras de infraestrutura – como o reforço do contraforte, estrutura de vigas que sustenta o Cristo Redentor – e acessibilidade, além de projetos de manejo de espécies exóticas e de pesquisas científicas.
((o))eco procurou a assessoria de comunicação do vice-presidente para esclarecer seu posicionamento sobre o pedido, mas não obteve retorno até o fechamento desta matéria. O espaço segue aberto.
Já a Mitra esclareceu em nota que: “A Arquidiocese do Rio de Janeiro busca sensibilizar as autoridades de todas as esferas para a grave situação em que se encontra o Complexo do Alto Corcovado para que possam atuar e contribuir dentro de suas atribuições funcionais. Em relação ao ICMBio, a Arquidiocese está e sempre estará aberta ao diálogo”.
Procurada para comentar a questão, a administração do Parque Nacional da Tijuca/ICMBio também não respondeu no prazo solicitado pela reportagem. O espaço segue aberto e o texto será atualizado caso haja retorno.
Conforme o último Termo de Compromisso firmado entre as partes, a Mitra tem o direito de desenvolver livremente as atividades religiosas, culturais, econômicas, comerciais e sociais na área do Santuário Cristo Redentor, que se encontra no platô do morro do Corcovado. Sendo a entidade obrigada a seguir as normas e restrições do plano de manejo do parque, assim como não impedir acesso dos turistas ao platô superior no horário de funcionamento e operação do Parque Nacional da Tijuca no Corcovado (todos os dias de 8:00 às 19:00).
A desafetação da área do Alto Corcovado de dentro do parque significa remover o órgão ambiental da equação, dando total controle do monumento por parte da Mitra.
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Anualmente, o Parque Nacional da Tijuca recebe mais de 4 milhões de visitantes, mais da metade deles no Setor Serra da Carioca, onde está o Corcovado, um dos principais pontos turísticos da cidade.
A arrecadação dos ingressos e por meio dos contratos com as concessionárias é considerada fundamental para bancar a gestão e manutenção da unidade de conservação, como um todo. Hoje R$6,00 de cada ingresso vendido vão para a Mitra Arquiepiscopal, para fins de apoio ao Projeto Amigos do Cristo Redentor, que ajuda a manter o Santuário do Cristo Redentor. Além disso, a entidade fatura com a realização de eventos, tanto religiosos (como casamentos e batizados), quanto comerciais no platô do Cristo, e com a iluminação da estátua.
Propostas no legislativo
Atualmente, duas propostas tramitam no legislativo sobre o tema. O Projeto de Lei n° 3.490/2024, apresentado no Senado, em setembro do ano passado, pelos senadores Flávio Bolsonaro (PL-RJ), Romário (PL-RJ) e Carlos Portinho (PL-RJ), que “exclui a área do Alto Corcovado dos limites do Parque Nacional da Tijuca”, o equivalente a 6.771,73 m².
Da base do governo vem a outra proposta, apresentada em agosto – no mesmo dia em que foi enviada a carta – pelo então deputado federal e atual prefeito de Maricá, Washington Quaquá (PT-RJ). Em seu texto, o projeto de lei nº 3.208/2024 transfere a área do monumento do Cristo Redentor para a Mitra Arquiepiscopal Do Rio De Janeiro.