Mais de uma década depois do acidente que parou o Brasil, a série “Congonhas: Tragédia Anunciada” chegou à Netflix e rapidamente se destacou entre os conteúdos mais assistidos da plataforma. Com direção de Angelo Defanti, o documentário em três episódios propõe uma análise profunda do desastre aéreo ocorrido em 17 de julho de 2007, quando um Airbus A320 da TAM, vindo de Porto Alegre, ultrapassou a pista do Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, e colidiu contra um prédio da própria companhia aérea, provocando 199 mortes.
Entre as mais dolorosas catástrofes da aviação comercial brasileira, o acidente é abordado na produção de forma sensível, mas também investigativa. Com entrevistas de familiares, especialistas e profissionais envolvidos no resgate, a série constrói um retrato amplo das falhas e omissões que cercaram o caso.
Memórias que ainda doem
Também nas entrevistas, familiares relatam a dor de não poder se despedir, já que muitos corpos ficaram irreconhecíveis, além da demora para identificação das vítimas. Um policial envolvido no resgate descreveu: “Minha missão ali foi servir com o máximo de humanidade e respeito. Cada vida perdida e cada família impactada seguem sempre em nossas orações”.
As causas do acidente: o que deu errado?
A produção apresenta as conclusões do CENIPA (Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos), apontando uma combinação de erro humano, falhas operacionais e lacunas na regulamentação como fatores determinantes para a tragédia. Na tentativa de pouso, apenas uma das alavancas de propulsão foi colocada em marcha lenta, enquanto a outra permaneceu em modo de aceleração — o que comprometeu o controle da aeronave. Soma-se a isso o fato de que o reversor de empuxo estava inoperante, algo que era permitido pela legislação da época, mesmo sob chuva.
A tragédia em um contexto de crise: o “apagão aéreo”
O acidente de Congonhas ocorreu em meio ao que ficou conhecido como “apagão aéreo brasileiro”, iniciado com a queda do voo 1907 da Gol em 2006, após colisão com um jato Legacy. O setor da aviação civil já enfrentava sérios problemas de infraestrutura, controle de tráfego e fiscalização, o que intensificou o clima de desconfiança e revolta popular.
O que mudou após o desastre?
Embora especialistas afirmem que as melhorias vieram por um conjunto de fatores, o acidente de 2007 foi um divisor de águas para o setor. Após a tragédia, autoridades como a Infraero, a Aeronáutica e a ANAC implementaram diversas medidas. Entre elas, a criação de uma nova torre de controle em Congonhas, reformas na pista de pouso, e sistemas mais rigorosos de controle de textura e atrito das pistas.
Além disso, o controle de tráfego aéreo passou por modernizações, com novos protocolos operacionais para ampliar a segurança dos voos comerciais.
A busca por justiça e reparação
Em 2017, dez anos após o acidente, a fabricante Airbus chegou a um acordo com a Justiça brasileira, aceitando pagar mais de R$ 30 milhões a um grupo de 33 familiares de vítimas. A empresa informou que, até 2022, apenas uma ação judicial ligada ao acidente permanecia em andamento.
Uma história que não se apaga
A força de “Congonhas: Tragédia Anunciada” está em relembrar, com respeito e profundidade, um episódio que continua vivo na memória nacional. A série não apenas reconstrói os fatos, mas também humaniza as estatísticas, devolvendo nome, história e dignidade às vítimas e suas famílias.
Mais do que um documentário sobre aviação, é um retrato da dor, da responsabilidade e da esperança por um sistema mais seguro e eficiente. Disponível na Netflix Brasil, a produção é uma reflexão essencial sobre as consequências do que muitos já classificavam, à época, como uma tragédia anunciada.