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Desenho de orixá: moradores cobram PM após ação armada em escola

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Metrópoles

Moradores dos bairros Caxingui e Instituto de Previdência, na zona oeste de São Paulo, fizeram um abaixo-assinado cobrando a atuação da Corregedoria da Polícia Militar contra quatro policiais militares que entraram armados na Escola Municipal de Educação Infantil (Emei) Antônio Bento, na última quarta-feira (12/11), depois que uma criança fez o desenho de uma orixá durante uma atividade escolar.

Os agentes foram acionados pelo pai da menina, que teria dito que a filha estava sendo obrigada a ter “aula de religião africana”. Segundo testemunhas, os policiais foram hostis com a equipe da escola, afirmando que a atividade escolar configurava “ensino religioso”. Um deles portava uma metralhadora, de acordo com uma mãe que presenciou a cena.

A direção da escola explicou aos agentes que o desenho fazia parte de uma atividade com o livro infantil “Ciranda em Aruanda”, que está no acervo oficial da rede municipal de São Paulo, e disse que as crianças apenas ouviram a história do livro e fizeram um desenho na sequência (saiba mais sobre a atividade abaixo).

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Mesmo assim, os policiais ficaram cerca de uma hora na escola e teriam feito acusações de que a religião da família da criança, que é cristã, estava sendo desrespeitada.

O abaixo-assinado, aberto na noite deste domingo (17/11), havia reunido cerca de 800 assinaturas até a manhã desta segunda-feira (17/11) em defesa da escola e contra a postura dos policiais e do pai que chamou os agentes.

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Desenho da orixá Iansã que motivou pai de aluna de escola infantil de São Paulo a chamar a polícia

Material cedido ao Metrópoles2 de 3

Desenhos de alunos do EMEI Antônio Bento, em São Paulo, em atividade intitulada “Ciranda de Aruanda”

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Desenhos que alunos do EMEI Antônio Bento, em São Paulo, fizeram em atividade sobre religiões de matriz africana

Material cedido ao Metrópoles

A advogada Beatriz Branco, de 34 anos, conta que teve a ideia de fazer o abaixo-assinado depois de ler a reportagem do Metrópoles sobre o caso. “Todo mundo ficou muito estarrecido com o que aconteceu”, conta ela.

A moradora diz que os vizinhos têm uma relação muito próxima com a escola, considerada referência na região, e quiseram demonstrar apoio ao trabalho dos profissionais da unidade. Para ela, o episódio mostra a importância de trabalhar temas antirracistas na educação.

“Esse pai, se tivesse tido esse tipo de educação que a escola está oferecendo, provavelmente ele não teria esse tipo de reação. Foi preconceito. Eu não sei qual a religião dele, mas eu respeito. Foi um desrespeito às culturas diferentes da dele”, afirma.

Os moradores reivindicam que a conduta dos PMs seja investigada para apurar “eventual abuso de autoridade e violação dos direitos das crianças”, e pedem que a Corregedoria da Polícia “tome as medidas cabíveis de punição”.

O documento também cobra uma apuração dos fatos pelas demais autoridades, com responsabilização do pai que teria rasgado um mural onde estava o desenho, e reivindica ações de conscientização sobre “diversidade cultural, direitos humanos e combate ao racismo e à intolerância religiosa” com os envolvidos no episódio.

Qual era a atividade escolar?

  • Segundo funcionários da escola ouvidos pelo Metrópoles sob condição de anonimato, a atividade estava ligada à leitura do livro “Ciranda em Aruanda”.
  • Na obra, a autora Liu Olivina traz ilustrações de 10 orixás e apresenta, em textos curtos, as características das divindades – Oxóssi, por exemplo, é retratado como “o grande guardião da floresta”.
  • O livro recebeu o selo Altamente Recomendável pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ) e faz parte do acervo oficial da rede municipal de ensino.
  • Uma professora da Emei teria lido o livro para os alunos. Na sequência, cada estudante fez um desenho sobre a história. A menina, de 4 anos, desenhou Iansã, orixá ligada aos ventos e tempestades.
  • Os desenhos foram expostos no mural da escola.

Ministério da Igualdade Racial acionado

Nesta segunda-feira (17/11), a deputada federal Luciene Cavalcante, o deputado estadual Carlos Giannazi e o vereador da capital paulista Celso Giannazi, todos do PSol, acionaram o Ministério da Igualdade Racial e solicitaram que o caso seja acompanhado pelo governo federal.

O grupo pede que o Ministério avalie fazer recomendações específicas ao Estado de São Paulo e ao município de São Paulo sobre atuação policial em escolas, “vedando o uso ostensivo de armamento pesado em unidades de educação infantil, salvo em situações de risco concreto”.

“Chama atenção o fato de que a Polícia Militar, acionada por um responsável que já havia destruído trabalhos das crianças em um mural, deslocou-se à escola não para garantir a proteção da comunidade escolar diante de um ato agressivo de um adulto, mas para constranger a equipe pedagógica que cumpria o currículo antirracista previsto em lei. Ou seja, a escola, e não o autor dos atos de truculência, foi tratada como suspeita”, afirmam os parlamentares no ofício.

Além disso, os parlamentares sugerem que o Ministério produza um material com orientações para redes de ensino e órgãos de segurança pública sobre o tratamento de conteúdos relativos às religiões de matriz africana nas escolas; e desenvolva ações formativas voltadas à prevenção do racismo religioso, à proteção da comunidade escolar e ao fortalecimento do currículo antirracista.

Os deputados e o vereador psolistas também acionaram o Ministério Público de São Paulo e a Corregedoria da Polícia para investigar o caso, e dizem que a nota enviada pela Secretaria da Segurança Pública para a reportagem do Metrópoles é “omissa” e “não reconhece a total inadequação de ingresso de policiais fortemente armados numa Emei”.

Entre os pedidos para a Corregedoria estão o de que seja determinado o “afastamento cautelar dos policiais envolvidos”, enquanto as apurações sobre eventual abuso de poder são feitas.

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Outro lado

Em nota enviada à reportagem na sexta-feira (14/11), a Secretaria da Segurança Pública (SSP) afirmou que, ao atender à ocorrência na Emei Antônio Bento, os policiais conversaram com as partes – pai e diretora da instituição de ensino.

“Ambos foram orientados a registrar boletim de ocorrência, caso julgassem necessário. A Corregedoria da PM está à disposição para apurar eventuais denúncias sobre a conduta policial”, disse a pasta.

A SSP acrescentou, ainda, que o uso do armamento, que inclui metralhadora, faz parte do Equipamento de Proteção Individual (EPI) dos policiais e é portado durante todo o turno de serviço.

O Metrópoles questionou a pasta, nesta segunda-feira (17/11), se alguma investigação foi aberta na Corregedoria, mas ainda não obteve resposta. O espaço segue aberto.

Já a Prefeitura de São Paulo, por meio da Secretaria Municipal de Educação (SME), informou que o pai da estudante recebeu esclarecimentos de que o trabalho apresentado por sua filha integra uma produção coletiva do grupo.

“A atividade faz parte de propostas pedagógicas da escola, que tornam obrigatório o ensino de história e cultura afro-brasileira e indígena dentro do Currículo da Cidade de São Paulo”, reforçou a gestão municipal.

Fonte: www.metropoles.com