São Paulo — O prefeito da capital, Ricardo Nunes (MDB), de 57 anos, se viu nesta semana às voltas com assunto que ele tenta evitar desde as eleições passadas: o boletim de ocorrência (BO) por ameaça registrado contra ele, em 2011, por sua mulher, a primeira-dama, Regina Carnovale Nunes, 43.
A explicação que o casal dá sobre o tema é controversa. Quando a existência do documento foi revelada, em 2020, Regina deu uma entrevista dizendo que não se lembrava de ter feito o registro e duvidou da veracidade do BO, embora o boletim de ocorrência seja real.
Nessa semana, abordado sobre o assunto durante sabatina promovida por Folha/UOL, Nunes reafirmou que Regina não prestou a queixa e disse que o documento foi “forjado”, após ter sido questionado três vezes. No dia seguinte, a Secretaria Estadual da Segurança (SSP) desmentiu o prefeito, reafirmando que o BO está em seu sistema.
Boletim de ocorrência
O boletim que tem Regina como vítima e Nunes como autor foi feito em 18 de fevereiro de 2011, uma sexta-feira, na Delegacia de Defesa da Mulher de Santo Amaro, na zona sul de São Paulo. As denúncias são de violência doméstica, ameaça e injúria.
O relato do registro não descreve nenhuma violência física, mas xingamentos e perseguições do prefeito, na época um empresário em ascensão, que estaria “inconformado com a separação” do casal, que já durava sete meses. A separação teria ocorrido por “ciúmes excessivo” da parte dele, segundo o registro policial.
Em 2020, após o caso vir à tona, antes mesmo de Nunes tomar posse, o prefeito e a primeira-dama contrataram um advogado para investigar o tema a fundo. Eles receberam um relato de que o registro policial de fato existe e, na época, após ser elaborado, o boletim foi encaminhado à Delegacia de Embu-Guaçu, onde Regina estava morando. Mas, na cidade vizinha à capital, o BO original, que teria assinatura dela, havia desaparecido.
A falta do papel assinado foi recebida como um atestado de que não há prova cabal de que foi Regina quem fez o BO, abrindo margem para sustentar a versão de que o documento possa ter sido feito por um terceiro, “forjado”.
Crise do passado
Nunes costuma contar a amigos que quando conheceu Regina sua empresa era uma sala de quatro metros quadrados e ela, uma moça da periferia filha de uma merendeira e de um cobrador de ônibus. Ou seja, vieram “do nada”, como ele diz, e ascenderam juntos na vida.
Os dois filhos mais velhos do prefeito são de seu primeiro relacionamento, mas foram criados por Regina e a chamam de mãe. O casal teve a terceira filha há 17 anos e, agora, espera o segundo neto.
Mas quando já estavam há 12 anos juntos, em 2010, eles se separaram. Foi neste período que o BO foi feito. Aos amigos, quando fala do assunto, o prefeito admite que o período foi conflituoso e ambos tinham advogados e desentendimentos relacionados, por exemplo, à pensão alimentícia.
Mas Nunes jura que nunca ameaçou Regina. À época, ele fez um boletim de ocorrência relatando ter sido ameaçado pela mulher na porta de sua empresa — ele nunca negou a existência desse registro.
Passado esse período de tensão, entretanto, o casal se reconciliou. Ambos se perdoaram, voltaram a viver juntos e transformaram em casamento oficial a união estável que mantinham até então. Regina abandonou o nome de solteira e adotou o sobrenome de origem portuguesa do marido. Ele decidiu concorrer a vereador pela primeira vez no ano seguinte, em 2012, e venceu, iniciando uma trajetória que o levou à cadeira de prefeito.
Ela nega
Regina nega categoricamente ter feito o boletim de ocorrência e também o teor do relato que consta no registro policial. Quando o caso ressurgiu, na última semana, ela publicou fotos do casal no Instagram, com a música “Daqui pra sempre”, de Manu Bahtidão e Simone Mendes, que tem entoada no refrão a frase “eu e você contra o mundo”.
Na publicação, ele a escreveu: “27 anos de um casamento com muito amor, respeito e companheirismo. Te amo, marido”.
A primeira-dama gravou uma série de vídeos reafirmando as negativas e repassou para a equipe de publicidade da pré-campanha do prefeito. Os marqueteiros queriam publicar o material, mas Nunes vetou. Argumentou que não queria esse tipo de exposição e que temia que os adversários o acusassem de ter “obrigado” Regina a fazer a defesa.
Na segunda-feira (15/7), logo após ter deixado a sabatina em que tratou do BO, Nunes mandou uma mensagem de WhatsApp para Regina. “Viu a sabatina?”, perguntou. Ela tinha visto. Como resposta, mandou uma sequência de quatro áudios com uma série de instruções em que o mandava ser mais enfático ao afirmar que ela não fez o registro e que ele não a ameaçou.
A parceria
Seria plausível Nunes dizer que, naquele período de conflito, 13 anos atrás, em meio a brigas e mágoas, ele havia extrapolado limites dos quais se arrepende e admitir que sua mulher fez, sim, o boletim contra ele.
Mas, na cabeça do prefeito, só lhe cabe estar ao lado da versão de sua mulher. Ela não nega apenas em público ter feito o registro, mas também para ele. Duvidar disso, ainda mais publicamente, traria uma nova crise ao casal.
“Se perder a eleição, fico na Prefeitura até dezembro. Se ganhar, fico até 2028. Com a Regina, vou ficar até eu ir embora [morrer]”, afirmou Nunes ao Metrópoles.
Diante da polêmica, Nunes foi aconselhado por sua equipe a fazer um media training — um curso para se preparar para respostas durante entrevistas —, mas recuou. Aos auxiliares e aliados, o prefeito disse que não quer perder a naturalidade ao tratar do assunto.
Fonte: Oficial