Um território isolado e cercado por rodovias, em uma das periferias de Campinas, no interior de São Paulo, foi projetado para abrigar atividades ligadas à prostituição. Trata-se do Jardim Itatinga, instalado estrategicamente na região sudoeste do município, distante da chamada “moral familiar”, que não quer se aproximar da rotina das trabalhadoras do sexo e dos clientes que as procuram por prazer.
O bairro foi projetado deliberadamente pelo poder público na década de 1960, durante a ditadura militar. O objetivo era claro e persiste até hoje: concentrar em uma área isolada toda atividade relacionada à prostituição.
Entre as rodovias dos Bandeirantes e Santos Dumont, foram construídas diversas casas — de pequeno, médio e grande porte — para onde são atraídos homens e mulheres, trabalhadores ou clientes do sexo.
A “zona” surgiu inspirada no sistema regulamentarista francês, que via a prostituição como um “mal necessário”, a ser controlado e confinado. A intenção do distanciamento era de “higienizar” a cidade, mantendo seus valores e moral preservados.
Além do planejamento geográfico, a institucionalização da prostituição no território logo levou a regulamentações, como o fichamento das prostitutas na delegacia de polícia e exames ginecológicos obrigatórios para as trabalhadoras do sexo.
Em outras cidades do estado, como a capital paulista, essas práticas já haviam sido abolidas, mas foram adotadas pelo poder público de Campinas, se alinhando ao padrão de desenvolvimento urbano do município.
Segregação espacial
No artigo “Preta, pobre e puta: a segregação urbana da prostituição em Campinas”, a professora, arquiteta e urbanista Diana Helene Ramos afirma que a cidade se formou em torno de uma dicotomia entre o norte e o sul, regiões separadas pela linha férrea da Ferrovia Paulista S/A (Fepasa).
No norte, está a parte mais valorizada da cidade, com universidades, shoppings e condomínios de alta renda. Ao sul, estão as indústrias, os assentamentos informais e o Jardim Itatinga.
Para a especialista, o fato de o bairro estar isolado entre rodovias reforça que o território seja “impuro” e “desviante”, o que aumenta a estigmatização dos grupos que ali estão. Ao mesmo tempo, a segregação visava a “limpeza moral” e a “revitalização” das áreas centrais, de onde foram removidas não apenas as prostitutas, mas também as famílias pobres e outros grupos marginalizados que ali viviam.
Prostitutas resistem no centro de Campinas
Mesmo com o Jardim Itatinga abrigando o setor de prostituição em Campinas, trabalhadoras do sexo resistem no centro da cidade, como uma forma de resposta ao projeto segregacionista. Foi nesse contexto que surgiu a Associação Mulheres Guerreiras, em 2007.
Resistindo à repressão policial, essas mulheres ocuparam pontos estratégicos no centro de Campinas, formando uma rede de apoio para as prostitutas. Elas também negociaram a permanência ali com os frequentadores da região.
Assumindo a identidade de “putas” com orgulho, essas trabalhadoras do sexo ainda reivindicam o direito à cidade, e questionam a estigmatização do gênero feminino.
“Gangue do puteiro”
- O Jardim Itatinga entrou no noticiário esta semana, após uma ação da Polícia Civil em conjunto com o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público de São Paulo (MPSP).
- A investigação descobriu uma quadrilha que extorquia clientes de casas noturnas no bairro de Campinas. O grupo movimentou R$ 1,2 milhão em cerca de um ano de atuação.
- Segundo a Polícia Civil, 27 integrantes do grupo criminoso foram identificados. Dez pessoas foram presas e dois adolescentes acabaram apreendidos nessa terça-feira (15/7) suspeitos de participação no golpe.
- O modus operandi do grupo motivou o nome da operação, Illudere, termo latino que significa ludibriar.
- De acordo com as autoridades, os suspeitos obrigavam as vítimas, clientes das casas noturnas, a realizar pagamentos de quantias exorbitantes. Se não pagassem, não eram liberados pelos criminosos e continuavam mantidos como reféns.
Fonte: www.metropoles.com