Os deputados da Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT) aprovaram, no início da tarde desta quarta-feira (11), a proposta de Emenda à Constituição Mato-grossense que limita a criação de novas áreas protegidas no estado. Foram 19 votos favoráveis, quatro abstenções e apenas um voto contrário. Por ser de autoria do governador Mauro Mendes (União Brasil-MT), a sanção é dada como certa.
Apresentado inicialmente em dezembro de 2022, ao longo de sua tramitação, o projeto de emenda à Constituição (PEC 12/2022) recebeu um substitutivo, que não eliminou os pontos mais polêmicos da proposta original de Mauro Mendes. Pelo contrário, a nova redação incluiu novos trechos controversos, segundo organizações não-governamentais do estado.
Em linhas gerais, o texto aprovado nesta quarta-feira em segunda votação prevê que a criação de novas áreas protegidas só poderá ocorrer após a regularização fundiária de 80% das unidades de conservação já criadas em Mato Grosso. E somente se houver garantia de que o governo tenha dotação orçamentária para a indenização de propriedades sobrepostas.
Além disso, ele aumenta de dois para 10 anos o prazo que o Estado tem para a implementação das UCs já existentes. Pela nova regra, o governo estadual também fica autorizado a receber recursos, por meio de doações, para a criação de unidades de conservação de uso público.
Atualmente, o Sistema Estadual de Conservação Mato-Grossense conta com 47 unidades, entre parques estaduais, reservas, áreas extrativistas e estações ecológicas, entre outras categorias. Tais unidades somam mais de 2,8 milhões de hectares.
Segundo o governo do Estado, somente uma pequena parte desse território já possui regularização fundiária, o que induziria a uma “falsa proteção ao meio ambiente regional”.
A aprovação da PEC foi comemorada no Plenário da ALMT. “Parabenizo o governador Mauro Mendes pela iniciativa dessa proposta, que vai coibir novas unidades de conservação, novos parques, reservas ambientais […] A gente vive na iminência de se criar mais parques. É o mesmo drama de quem vive no Araguaia, por exemplo, daquelas pessoas que desbravaram e agora estão tendo a oportunidade de produzir, correndo o risco de ser transformado em mais parque”, disse a deputada Janaína Riva (MDB).
Já Lúdio Cabral (PT), único parlamentar contrário à proposta, lembrou que a proposta é inconstitucional, já que é de responsabilidade privativa da União propor regra geral no que diz respeito à criação de novas unidades. Além disso, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal admite que Estados editem apenas normas mais protetivas ao meio ambiente, com fundamento em suas peculiaridades regionais, o que não é o caso.
“A proposta é um retrocesso que não tem tamanho. A constituição do estado tem um capítulo que trata da proteção ao meio ambiente e uma das formas de se proteger o meio ambiente é criando unidades de conservação. Daí a Assembleia Legislativa do MT vai aprovar uma Emenda Constitucional de proposta do governador que coloca no capítulo de proteção do meio ambiente a proibição de se criar unidades de conservação. Isso é absolutamente sem sentido. Isso óbvio será objeto de Ação Direta de Inconstitucionalidade”, disse Lúdio Cabral (a partir de 1h21min).
Manifestações da sociedade civil
Ao longo de sua tramitação, a proposta recebeu duras críticas. Em janeiro de 2023, cerca de 30 organizações socioambientais do estado enviaram uma nota técnica ao governo alertando para os problemas jurídicos da proposta.
Segundo a nota técnica, a PEC 12/2022 representa uma “grave fragilização da Política Estadual de Meio Ambiente” e uma violação explícita à Constituição Federal.
Além de lembrar que é competência privativa da União legislar sobre requisitos de criação de UCs, quando estes menos protetivos, as organizações denunciaram a falta de subsídios técnicos que comprovem a impossibilidade de regularização das UCs já existentes no estado, além de ser omissa em relação à proibição de indenizações das áreas que não tenham prova de domínio anterior à criação das unidades. Isto é, que foram invadidas e griladas.
A ((o))eco, Edilene Amaral, consultora jurídica do Observa-MT, afirmou que a proposta visa privilegiar interesses patrimoniais privados em detrimento da proteção ambiental e da responsabilidade do Estado de não adotar medidas ao longo do tempo para implementá-la.
“Apesar dos alertas e apelo da sociedade, a ALMT mantém a vontade do governo em estabelecer uma narrativa contra as Unidades de Conservação e sua impossibilidade de regularização. A inviabilização da criação de novas áreas protegidas, mesmo aquelas que não demandam desapropriação, é evidentemente inconstitucional, posto que subordina direitos fundamentais coletivos ao meio ambiente equilibrado aos interesses privados, fragilizando a política ambiental do estado.”
Segundo apurou ((o))eco, a judicialização da norma aprovada já é estudada.