Na Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2023 (COP28), foi feito um acordo para abandonar o uso dos combustíveis fósseis, com o ano de 2050 como marco para atingir a neutralidade de carbono. Além disso, há a necessidade do Brasil cortar suas emissões em pelo menos 92% até 2035 para contribuir de forma justa para limitar o aquecimento do planeta em 1,5ºC, como proposto pela meta do Acordo de Paris.
Do debate global ao local, nos próximos dias acontecerão as eleições municipais. As discussões sobre o futuro das cidades passam por novos olhares e estratégias de gestão municipal. Para criar cidades 2030, precisamos de candidaturas comprometidas em garantir uma transição energética com proteção social. E aqui estamos falando mais especificamente de dois temas: a necessidade urgente de investirmos em transportes limpos e renováveis ao mesmo tempo em que resolvemos desafios estruturais do sistema de transporte, como sua lógica mercadológica e o valor da tarifa.
Do emergencial ao estrutural, foi assim que elaboramos a pesquisa De Olho no Transporte 4, uma publicação que é fruto de uma análise sobre a relação das altas taxas de emissões de gases do efeito estufa na região metropolitana do Rio de Janeiro e o transporte público ao mesmo tempo que discute a política da tarifa zero como medida crucial na busca por cidades triplo zero: zero mortes, zero emissões e zero tarifa.
O transporte é historicamente uma das principais pautas da Casa Fluminense por entendermos que o direito à cidade e todos seus equipamentos públicos essenciais – como saúde, educação, emprego e cultura – dependem da garantia do livre e possível acesso de circulação das pessoas, sendo um dos setores chave no processo de transição energética justa, já que hoje é uma das categorias que mais contribuem para as emissões de gases do efeito estufa.
Analisando dados históricos, identificamos que: 1 – os valores médios de temperatura em pelo menos 19 dos 22 municípios da região metropolitana do Rio aumentaram em 20 anos de análise; 2 – para neutralizar as emissões de carbono geradas pelo transporte rodoviário de passageiros seria necessário o plantio anual de 50 milhões de árvores no estado.
A transição energética é uma realidade inevitável, os recursos escassos e os efeitos climáticos alertam sobre a necessidade vital de acelerarmos esse processo. Falando em transição, políticas de redução tarifária ou tarifa zero – assim como a política do uso de energias renováveis e biocombustíveis no transporte público – também contribui para cidades mais limpas e seguras. Investir em transporte público bom, gratuito, seguro e limpo é por si só uma política pública eficaz de desincentivo ao carro e diminuição das emissões de gases de efeito estufa. As duas medidas, políticas públicas transversais e urgentes, combinadas tornarão as cidades brasileiras modelos de cidades 2030.
A necessidade de mudança está dada, não há outro caminho, mas é necessário também garantir que essa transição energética seja feita de forma justa e inclusiva, sem que se reproduzam mais desigualdades. É fundamental pensar em mecanismos de proteção social para garantir que quem mais precisa não fique de fora. Frente a esse desafio, serão necessários investimentos robustos por parte dos governos com a adoção de novas tecnologias e implementação de infraestruturas.
Uma ação para caminhar nesse sentido é a criação de um Sistema Único de Mobilidade (SUM). Apresentado também na Agenda Rio 2030, sua lógica é baseada nos princípios de equidade, universalidade, acessibilidade, integralidade e sustentabilidade. E promoveria uma atuação integrada entre governos federal, estadual e municipal, assim como é feito com o Sistema Único de Saúde (SUS). Dessa forma, o custo do transporte público é dividido entre os três níveis de governo, aumentando o compartilhamento de responsabilidades e permitindo maiores possibilidades de implementação de projetos de mobilidade, que precisam de recursos robustos para sair do papel.
Algumas orientações fundamentais do SUM que se conectam com o debate da transição energética justa são: a adoção de metas para melhoria e sustentabilidade do transporte; definição de fontes de receitas extra tarifárias para financiamento coletivo do transporte público; instrumentos para maior controle público sobre o sistema de transporte; e a criação de autoridades metropolitanas para o transporte público, para melhoria na integração entre diferentes modais.
Esse conjunto de medidas seriam capazes de promover mudanças estruturais para solucionar problemas históricos do transporte público nas cidades. Com um sistema mais efetivo, mais pessoas passam a utilizá-lo, o que, naturalmente, reduz o número de carros nas ruas e também influencia positivamente na qualidade do ar e nas emissões geradas.
Virada à brasileira é necessária
Além disso, também é necessário reconhecer que vivemos em um país de proporções continentais, com diferentes biomas e uma produção agrícola robusta e diversa, logo, quando se pensa em diversificação de fontes de energia, não há como negar que o Brasil possui um potencial grande na produção de biocombustíveis. E sua produção, acompanhada de investimentos no setor, pode auxiliar na redução de emissão de GEE frente a alta dependência de combustíveis fósseis.
O fato é que projetar um novo futuro olhando para 2030 é investir, sobretudo, na mobilidade urbana. Um direito social básico que dá acesso a outros direitos essenciais, mas que muitas vezes é excludente, por sua lógica de operação na maioria das cidades. O caminho para a justiça social é pelo transporte público com zero mortes, zero emissões e zero tarifas.
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