O embaixador André Corrêa do Lago divulgou nesta segunda-feira (10) a primeira carta enviada à comunidade internacional pela presidência da 30ª Conferência do Clima da ONU (COP30). O documento sintetiza as prioridades do Brasil no comando da Cúpula deste ano, a ser realizada entre 10 e 21 de novembro em Belém (PA), e dá o tom da política que o país pretende seguir na condução do processo de negociação. Sociedade civil elogia tom, mas aponta ausências importantes, como menção ao fim dos combustíveis fósseis.
Na carta, um documento de 11 páginas, a presidência brasileira toca em pontos importantes e sensíveis, no contexto de acirramento das tensões entre países – o que tem potencial de fragilizar o processo multilateral – e crescimento de ações contra as evidências da Ciência climática.
Ao citar o fim da Segunda Guerra Mundial – que desencadeou na criação da Organização das Nações Unidas –, Corrêa do Lago defendeu o multilateralismo e pediu que países se unam contra o novo “inimigo comum: a mudança do clima”.
“Nesta década crítica, o Brasil convoca novamente nossa aliança de povos para, mais uma vez, deixarmos nossas diferenças de lado e nos unirmos para vencer o inimigo comum: a mudança do clima. Desta vez, contaremos com bases sólidas que nos levarão à vitória. A ciência confirma que temos os recursos para combater a mudança do clima”, disse.
Ele também sugeriu que os países se unam em um “mutirão global contra a mudança do clima”, para fazer da COP30 um pontapé inicial de uma nova década de inflexão na luta climática global.
“A cultura brasileira herdou dos povos indígenas nativos do Brasil o conceito de ‘mutirão’ (‘Motirõ’ em tupi-guarani), que se refere a uma comunidade que se reúne para trabalhar em uma tarefa compartilhada, seja colhendo, construindo ou apoiando uns aos outros. Ao compartilhar essa inestimável sabedoria ancestral e tecnologia social, a presidência da COP30 convida a comunidade internacional a se juntar ao Brasil em um mutirão global contra a mudança do clima, um esforço global de cooperação entre os povos para o progresso da humanidade”, continua a carta.
Movendo Alavancas
Para que as “alavancas” do processo de transição para economias de baixo carbono sejam movidas, André Corrêa do Lago convocou líderes globais e partes interessadas da sociedade para que se unam no desafio de movimentar as engrenagens dos processos necessários para tal fim.
Segundo ele, a COP30 vai convidar todas as presidências da COP21 (quando o Acordo de Paris foi criado) à COP29, para formar um “Círculo de Presidências”. Essa reunião de líderes serviria de aconselhamento sobre o processo político e a implementação da mudança do clima. Também serão convidados a este “círculo” as presidências da COP da Biodiversidade e da Desertificação.
Corrêa do Lago também falou em criar um “Círculo de Liderança Indígena” – para aumentar sua representação e garantir que os conhecimentos e a sabedoria tradicionais sejam integrados à inteligência coletiva global –, citou a importância das florestas no processo de descarbonização, do fortalecimento de mecanismos de adaptação, e detalhou os temas importantes que serão tratados na Cúpula do Clima de Belém.
“A presidência da COP30 está determinada a servir como uma plataforma de organização e mobilização coletiva, um veículo em um mutirão global contra a mudança do clima. Vamos puxar as alavancas juntos. Vamos mover o mundo”, finaliza o embaixador.
Repercussão
De modo geral, a carta repercutiu positivamente entre as organizações da sociedade civil, com elogios à robustez e tom das informações passadas.
“A Carta da Presidência da COP 30 apresenta uma série de acertos que merecem ser destacados. A ênfase no realismo climático como um norte para a conferência é um deles, ao exigir que a adaptação esteja no centro de todas as medidas propostas. Esse compromisso se fortalece com o foco na implementação, marcando a COP 30 como o início de uma nova etapa no processo multilateral”, disse Carolle Alarcon, gerente executiva da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura.
Elas, porém, destacam alguns pontos essenciais para o enfrentamento das mudanças do clima que passaram ao largo da carta, como o fim do uso de combustíveis fósseis, um tema sensível ao governo brasileiro, que tem gerado tensões internas, devido ao projeto de exploração de petróleo na Foz do Amazonas.
“Carta da presidência da COP30 inspira, mas exclui elefante na sala. Derrotar a emergência climática delineada no comunicado […] exige ação contra combustíveis fósseis”, disse o Observatório do Clima.
A 350.org chamou atenção para a necessidade de ações concretas, “não apenas discussões e anúncios de compromissos sem maneiras claras de implementá-las”.
Ilan Zugman, Diretor para a América Latina e Caribe da 350.org:
“Embora a carta reconheça a importância das NDCs, dos povos indígenas e das energias renováveis, ela não chega a exigir metas concretas de energia renovável e a eliminação gradual dos combustíveis fósseis. A presidência da COP30 não deve seguir os discursos contraditórios em torno da expansão dos combustíveis fósseis com os quais o governo brasileiro tem brincado ultimamente. A visão existe – agora precisamos ver os mecanismos que a transformarão em realidade”, disse IIan Zugman, diretor para a América Latina e Carige da organização.
Leia a carta da presidência da COP30 aqui.