São Paulo – Mesmo estando atrás das grades há 22 anos, Anderson Manzini, o Gordo, conseguiu administrar as atividades de seu núcleo criminoso no Primeiro Comando da Capital (PCC) e, em cerca de cinco anos anos, movimentou R$ 8 bilhões, bloqueados mês passado a pedido da Polícia Civil de São Paulo.
Isso ultrapassa o orçamento das capitais do Sergipe e Santa Catarina. Conforme as Leis Orçamentárias Anuais, aprovadas pelos vereadores, Aracajú e Florianópolis contam, neste ano, com R$ 3,9 bilhões de orçamento cada.
Gordo é apontado como braço direito de Wanderson Nilton de Paula Lima, o Andinho — ex-membro da mais alta esfera hierárquica do PCC e que, atualmente, se opõe a Marco Herbas William Camacho, o Marcola, junto com Roberto Soriano, o Tiriça, e Abel Pacheco de Andrade, o Vida Loka.
Como revelado pelo Metrópoles, o chefão da maior facção criminosa do Brasil se comunicava por meio de cartas, vazadas da cadeia. Os manuscritos eram fotografados pela esposa dele, Fabiana Lopes Manzini, e encaminhados aos destinatários indicados por Gordo.
Nas cartas, obtidas pela reportagem, o criminoso tenta garantir a própria vida, além de propor negócios para seu núcleo de parceiros e aliados, rendendo bilhões ao bando.
Após ter a morte decretada, por conta do racha de seu superior direto com Marcola, Gordo foi transferido da Penitenciária 2 de Presidente Venceslau, dominada pelo PCC, para o sistema prisional de Avaré, também no interior paulista.
De lá, ele seguiu comandando sua célula criminosa, com a ajuda da esposa, até o fim do ano passado.
Mais de 40 contatos
Os negócios de Gordo foram mantidos graças aos contatos feitos, por meio de Fabiana, com ao menos 40 pessoas, entre membros do alto escalação do PCC, “laranjas” e parceiros comerciais.
Em uma das conversas, a esposa dele cobra o “aluguel” semanal de uma boca de fumo, pertencente a ela e Gordo, no Campo Limpo e recebe do locatário a relação de lucros e gastos, também divididos entre o “empreendedor” e os titulares da biqueira da zona sul paulistana (veja galeria acima).
O valor pago por mês pelo ponto de venda de drogas é de R$ 2.800, segundo os comprovantes de R$ 700 enviados pelo locatário do crime, por semana. Com esse dinheiro, como apurado pelo Metrópoles, dá para alugar um casa de três quartos e 150 metros quadrados na mesma região.
Nas conversas, sempre em tom respeitoso, o interlocutor negocia para que Fabiana mude o pagamento, feito por semana, da sexta para a segunda-feira. Ele inclusive sugere de, com a troca das datas, fazer um único depósito de R$ 1.400 na primeira semana de mudança dos dias.
Todos os pagamentos eram feitos por transferência, via Pix, para três contas, nenhuma em nome de Fabiana, como mostram investigações da Delegacia de Investigações Sobre Entorpecentes (Dise) de Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo.
Os negócios de Fabiana e Gordo ajudaram a enriquecer todos os membros de seu núcleo criminoso, composto também por advogados e pessoas com intenções políticas, ou envolvidas em governos municipais.
Com a identificação de todos os suspeitos, a Dise conseguiu convencer a Justiça a bloquear os valores movimentados pelo bando, também superiores ao Produto Interno Bruto de São Tomé e Príncipe, na África, que no ano passado foi de 603 milhões de dólares, segundo o Banco Mundial das Nações Unidas. Isso, convertido para reais, equivale a R$ 3,3 bilhões.
Tráfico e “banco do crime”
O chefão, preso desde 2002 por roubo a banco, homicídio e extorsão mediante sequestro, usou sua esposa como “pombo-correio” para garantir a gestão de bocas de fumo e, também, a “diplomacia” com membros da alta cúpula da facção.
Fabiana foi presa em setembro de 2023, em uma ocorrência cotidiana de tráfico de drogas, quando estava na casa de um criminoso em Itaquaquecetuba, na região metropolitana de São Paulo.
Dois celulares que estavam com ela, apreendidos pela Dise de Mogi das Cruzes, continham diálogos que descortinaram um complexo e gigantesco esquema, administrado por Gordo da cadeia.
Além do tráfico de drogas e lavagem de dinheiro, a Polícia Civil descobriu a criação de um “banco do crime”, por meio do qual, além de mais de 19 empresas, foram movimentados os R$ 8 bilhões da quadrilha.
O dono da instituição financeira digital é João Gabriel Yamawaki, primo de gordo, que foi preso em 6/8 em uma operação deflagrada pela Dise de Mogi das Cruzes. Para se ter ideia, somente de João foram bloqueados R$ 501,3 milhões.
As mensagens também mostram a articulação do chefão do PCC para se infiltrar em campanhas eleitorais, nas eleições deste ano, em cidades do interior, litoral e região metropolitana de São Paulo.
Ao todo, seis membros do PCC são alvo da investigação na qual outras 26 pessoas também estariam diretamente envolvidas com os negócios do crime organizado.
As defesas dos suspeitos mencionados nesta reportagem não foram localizadas. O espaço segue aberto para manifestações.
As investigação da Dise continuam, mirando mais alvos revelados após a quebra do sigilo telemático dos dois celulares de Fabiana.
Fonte: Oficial