O deputado estadual Paulo Fiorilo (PT) acionou o Ministério Público de São Paulo (MPSP) para que o braço responsável pelo controle da atividade policial investigue as suspeitas envolvendo um esquema para fraudar gravações feitas por câmeras corporais da Polícia Militar (PM), reveladas pelo Metrópoles.
No documento, o parlamentar afirma que, “diante da gravidade dos fatos relatados”, é preciso saber quais providências estão sendo tomadas pelo Grupo de Atuação Especial de Segurança Pública (Gaesp), do MPSP. Fiorilo pede que se apure a possível prática de fraude processual e supressão de documento público, além de outras eventuais infrações penais relacionadas.
“A confiança da sociedade nas instituições de segurança pública está diretamente vinculada àexistência de mecanismos efetivos de controle externo e à preservação da legalidade, sobretudo no manuseio de provas digitais relativas a ações policiais potencialmente letais”, diz o parlamentar no ofício enviado ao Gaesp.
Conforme revelado pelo Metrópoles, a gravação da câmera corporal de um soldado envolvido na ocorrência que resultou na morte de Joselito dos Santos Vieira, em março de 2024, em Santos, foi deletada por uma major ligada à cúpula da PM. Antes de excluir o vídeo do sistema, a oficial fez uma série de adulterações para que ele não fosse identificado, como mudar a data e o nome do policial envolvido.
“Conforme dispõe a Portaria MJSP nº 648/2024, especialmente os artigos 11 a 13 da referida norma, os registros audiovisuais oriundos de câmeras corporais devem preservar integridade, autenticidade e rastreabilidade, sendo vedadas quaisquer modificações nos arquivos originais, sob pena de comprometimento da cadeia de custódia. As denúncias relatadas indicam possíveis violações a tais normas, bem como à Portaria PM1-4/02/24 da Polícia Militar, que torna obrigatório o registro contínuo das ações policiais. Tal cenário impõe imediata apuração, a fim de resguardar a legalidade, a transparência e os direitos fundamentais”, diz a requisição de Fiorilo ao MPSP.
“Totalmente fraudável”
A reportagem ainda deu detalhes sobre métodos que costumam ser utilizados por policiais militares para fraudar as gravações, deletando provas contra si mesmos. O ex-PM Bruno Dias, especialista em provas digitais e um dos responsáveis por implementar as câmeras da Axon na corporação, afirmou que o sistema é “totalmente passível de fraude”.
“O sistema tem inúmeras vulnerabilidades. É totalmente passível de fraude”, disse Dias ao Metrópoles. “Você pode apagar vídeos avulsos, apagar em massa. Você pode alterar a autoria, deixar o vídeo sem autor relacionado. Você pode também alterar data e hora do fato. Isso é gravíssimo. Compromete a legitimidade dos vídeos enquanto provas”, completou.
Ele explicou que a principal forma de pesquisa para encontrar um vídeo é justamente pela data e pela hora. Por isso, a alteração dessas informações torna praticamente impossível localizar uma gravação em um sistema que tem cerca de 20 milhões de vídeos. “Como você vai localizar? Você precisa dos metadados. Mas os metadados são totalmente adulteráveis dentro do sistema. Você fica totalmente ali sem entender como achar”.
O que diz a SSP
Questionada pelo Metrópoles, a Secretaria da Segurança Pública (SSP) disse que a denúncia citada pela reportagem é alvo de uma sindicância instaurada pela Polícia Militar para “apurar com o máximo rigor todas as circunstâncias relativas aos fatos”.
“A instituição reafirma seu compromisso com a legalidade, a transparência e, acima de tudo, com a defesa da vida. Condutas incompatíveis com os princípios da instituição não serão toleradas. Caso seja confirmada qualquer irregularidade, as medidas cabíveis serão adotadas para garantir a responsabilização dos envolvidos”, diz nota enviada pela SSP.
A reportagem também enviou uma mensagem para a major Adriana Leandro de Araújo. Até o momento da publicação, não houve retorno. Procurada, a empresa Axon também não retornou. O espaço segue aberto para manifestações.
Fonte: www.metropoles.com