São Paulo — Suspeitos de integrar uma quadrilha especializada em roubar bancos, com o auxílio de policiais militares corrompidos e também usando disfarces — como de mendigo e de técnicos de eletricidade — estão presos temporariamente, desde o dia 25 de julho, após a Polícia Civil paulista apresentar provas à Justiça sobre a ação do bando.
Todo o esquema foi levantado por aproximadamente oito meses de investigação. A denúncia feita por um PM à Corregedoria da corporação, afirmando ter sido procurado para ajudar em um roubo a banco, em março deste ano, reforçou apuração da Polícia Civil e foi o estopim para a decretação judicial de cinco prisões.
Alexandre de Oliveira Morais, o Careca, Alan Santos Justino, os irmãos David e Denilson Ferreira Targico, e o cabo da PM Izaias de Sousa, foram denunciados pelo Ministério Público de São Paulo (MPSP) como participantes de um roubo no qual foram levados quase R$ 900 mil de uma agência do Bradesco em Suzano, na Grande São Paulo, em 26 de novembro do ano passado.
Duas semanas antes, em São José do Rio Preto, parte do bando teria participado de um furto, no qual foi levado o equivalente e R$ 1,2 milhão de ouro, em uma fábrica de joias. A Polícia Civil investiga a eventual ação da quadrilha em outros roubos e furtos de instituições bancárias e empresas que lidam com cargas preciosas.
O Metrópoles localizou somente a defesa do policial. Em nota, o advogado João Victor Maciel Gonçalves afirma já ter apresentado “provas concretas”, com base em testemunhos e registros, de que seu cliente participava de um concurso público na ocasião, “comprovando a inocência” dele, que segue detido.
As defesas dos outros suspeitos não foi localizada. O espaço segue aberto.
PMs no esquema
Relatório da Corregedoria da Polícia Militar, obtido pelo Metrópoles, mostra que policiais prestaram depoimento, de forma protegida, sobre terem sido alvo de tentativa de cooptação para participarem de um roubo a banco, em março deste ano.
“Os criminosos buscavam policiais militares para escutar a frequência da PM”.
Os policiais corruptos realizam uma prestação de serviço chamada de “radinho” pelos criminosos, que consiste em alimentar o bando sobre acionamentos via 190, por meio da escuta da radiofrequência da corporação.
O recurso é usado para a quadrilha “antever” a eventual chegada de viaturas durante um roubo ou furto. Para isso dar certo, policiais que circulam pela região do alvo da quadrilha precisam ser “contratados”.
Microfone escondido
Com autorização judicial, um dos PMs aliciados pelo bando gravou uma conversa na qual estariam presentes o PM Izaias, Alan e Alexandre Morais, o Careca.
“Os diálogos são claros e revelam o vínculo e a estabilidade do grupo, bem como revela indícios de prática recente de outro roubo a agência ´prime’, ocorrido em Suzano”.
O vigilante que foi mantido como refém durante o assalto na Grande São Paulo afirmou, em depoimento à Polícia Civil, que o bando escutava a frequência da PM durante o assalto, “fato semelhante ao buscado pelos criminosos, ao cooptarem policiais”, para o roubo previsto para março deste ano.
Com base na conversa captada, a Justiça Militar decretou a prisão preventiva do cabo Izaias e o provável novo roubo a banco foi frustrado.
Suborno de R$ 200 mil
Em decisão de 16 de julho deste ano, o juiz Orlando Gonçalves de Castro Neto, do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), afirma que Alan Santos Justino planejava um roubo à agência do Bradesco de Ermelino Matarazzo, na zona leste paulistana, em março deste ano. Para isso, precisaria da ajuda de dois PMs, para os quais ofereceu R$ 200 mil, a serem divididos.
A investigação da Polícia Civil mostra que Alan iria oferecer o mapa da agência aos policiais, tranquilizando-os de que não iria usar explosivos e, também, reforçando não integrar o Primeiro Comando da Capital (PCC), alegando preferir “agir em família”.
No crime de Suzano, cada PM supostamente envolvido no esquema teria recebido R$ 20 mil, apontam registros policiais.
Roubo de Suzano
Com base em imagens de câmeras de monitoramento, a Polícia Civil identificou que o roubo da agência se dividiu em duas fases.
A primeira foi interromper o fornecimento de energia, para impossibilitar o funcionamento de câmeras, no interior do banco, da mesma forma que o acionamento do alarme.
Um criminoso disfarçado de mendigo, ainda não identificado, permaneceu por dias nas redondezas, ao ponto de receber comida de comerciantes.
A polícia percebeu que ele seria um olheiro da quadrilha, porque entre os dias 25 e 26 de novembro, de 2023, um homem careca, de jaqueta, circula insistentemente em frente à agência.
“Assim que ele passa pelo mendigo, parece dar alguma ordem para ele atravessar e rua e fique esperando do outro lado da rua, próximo da entrada do estacionamento”.
É justamente nesse ponto em que dois membros do bando, com uniformes de uma empresa concessionária de energia, descem de um carro e acessam a agência. Antes disso, um deles cumprimenta o falso mendigo.
No estacionamento, a dupla de falsos técnicos vai até a caixa de energia e corta cabos. A agência está sem eletricidade e pronta para a empreitada criminosa.
Invasão e roubo
O falso mendigo permanece o tempo todo em frente ao Bradesco, dentro do qual um vigilante foi encaminhado, para monitorar a agência durante a noite, por causa da falta de alarme e câmeras.
Por volta das 21h40, do dia 26, um domingo no ano passado, a mesma dupla de falsos técnicos retorna, consegue acessar o prédio passando-se por profissionais da concessionária, e rende o vigilante. Eles levaram maçarico e até comida, demonstrando que a quadrilha pretendia ficar bastante tempo por ali.
Participaram de todo do roubo ao menos 12 criminosos.
Dentro do banco
Na agência, a quadrilha agiu calmamente, sabendo que não seria identificada pelas câmeras — inoperantes da mesma forma que o alarme.
Toda a ação foi realizada por cerca de oito horas. Por volta das 5h10, da segunda-feira, os criminosos fugiram do local levando exatos R$ 882.967,79.
Neste mesmo momento, o falso mendigo se retirou de frente à agência. Um crime quase perfeito.
As imagens das câmeras das ruas, porém, ajudaram a polícia a identificar David Ferreira Targico. Ele é o homem careca que interage com o falso mendigo, no dia que precedeu o roubo.
As investigações constataram que ele se apresenta como empresário, no ramo de transporte executivo, e seria o responsável pela logística da quadrilha. Sua empresa, de acordo com a Polícia Civil, seria usada para lavar dinheiro.
Núcleos criminosos
David compõe uma estrutura organizada, de acordo com a investigação policial, chefiada por Alexandre de Oliveira Morais, o Careca. Ele é apontado como responsável pela estrutura e controle das ações do bando.
Abaixo dele estaria Alan Santos Justino, braço direito do chefão. O suspeito cuida, segundo a polícia, da execução dos planos de roubos e furtos, além de escalar participantes para as empreitadas criminosas.
O cabo Izaias de Souza seria responsável pela cooptação de PMs para exercer a função de escuta da frequência da corporação, para alimentar a quadrilha de informações durante os assaltos.
Na logística feita por Davi estaria a locação de veículos. Ele também serviria como olheiro , além de estudar possíveis alvos para outros crimes.
O irmão dele, Denilson Ferreira Targico compõe o núcleo operacional do bando, ainda segundo a polícia, efetuando cortes de energia e auxiliando no ingresso do bando aos locais.
Fonte: Oficial