As enchentes que arrasaram o Rio Grande do Sul entre abril e maio passados também atingiram parques e outras unidades de conservação. Estudos foram disparados para apontar se espécies foram prejudicadas nessas áreas, onde a vegetação conservada conteve estragos.
À frente da Coordenação de Emergências Climáticas e Epizootias (Coece) do ICMBio, Claudia Sacramento informou que os efeitos das enxurradas sobre a biodiversidade em unidades de conservação federais no Rio Grande do Sul serão conhecidos em até 30 meses.
“Também serão analisados os eventuais prejuízos sobre pessoas que habitam esses territórios”, disse. Há populações tradicionais e indígenas em determinadas reservas ecológicas no estado.
A investigação será apoiada pelos centros de pesquisa da autarquia, ligada ao Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA). A Coece foi criada no início do ano passado.
Passarão por análise igualmente os prejuízos sobre espécies migratórias e outras que sofriam com a gripe aviária. “Mais de 900 leões e lobos marinhos já haviam morrido pela doença na costa do Rio Grande do Sul e Santa Catarina”, revelou Claudia Sacramento.
Danos a estoques pesqueiros provocados, por exemplo, pela carga de poluentes que adentrou a Laguna dos Patos e o Atlântico, igualmente serão detalhados. “O impacto ecológico e social é muito grande”, estima a especialista.
Conforme ela, os resultados da investigação científica permitirão o desenho de políticas e de medidas para prevenir e reduzir os impactos socioambientais e econômicos de novos eventos climáticos extremos, como enchentes e secas.
“Mapearemos as possíveis emergências mais importantes para o trabalho do ICMBio de acordo com os cenários e projeções climáticas feitas pelas instituições competentes”, disse.

Contenção verde
Os dez parques e outras unidades federais de conservação nos limites gaúchos somam cerca de 25 mil km2, uma área pouco menor que a do estado de Alagoas, mostra um painel federal.
Os mais atingidos pelo aguaceiro de 2024 incluem o Parque Nacional de Aparados da Serra e as florestas nacionais de Canela e de São Francisco de Paula. Contudo, os danos foram quase que somente em equipamentos, casas, escritórios e estradas de acesso.
“Fauna e flora das unidades de conservação foram pouco afetados no geral muito em razão da própria vegetação nativa conservada”, disse Claudia Sacramento (ICMBio). “A vegetação faz um trabalho de manutenção do solo”, agregou.
Ao contrário de áreas urbanas, onde a vegetação foi muitas vezes banida de áreas alagáveis e outras que da mesma forma deveriam ser conservadas, parques e demais reservas ecológicas mantêm esses reforços naturais contra enxurradas.
“Sem isso, aumenta a vulnerabilidade de toda a população”, ressaltou Claudia Sacramento. “Não conservar o meio ambiente impacta diretamente a vida das pessoas”, reforçou.
Ao menos R$ 2 milhões já foram mobilizados para repor equipamentos e comprar veículos para unidades de conservação federais no Rio Grande do Sul.

Estragos menores
A Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura do Rio Grande do Sul (Sema) afirmou a ((o))eco que os impactos à biodiversidade em unidades estaduais de conservação são analisados com o apoio de universidades.
“Esses estudos são de médio a longo prazo”, estimou a Assessoria de Imprensa do órgão estadual. “Não há confirmação de extinções de espécies, até o momento”, afirmou
Como mostramos em reportagem de maio passado, há cerca de 280 espécies animais e 600 de plantas sob risco de sumirem do mapa no Rio Grande do Sul. Inúmeras viviam em meio às áreas afetadas pela enxurrada.
Elas incluem de cervos-do-pantanal habitando áreas alagáveis na Região Metropolitana de Porto Alegre a uma diminuta espécie de sapo vivendo em trecho de um rio encaixado num cânion da região serrana.
Quanto às reservas ecológicas, a Sema descreveu que apenas três das 25 unidades de conservação estaduais foram diretamente atingidas pelas enxurradas do ano passado.
Os estragos se concentraram na Área de Proteção Ambiental e no Parque Estadual Delta do Jacuí, na mesma Região Metropolitana da capital gaúcha, e no Parque Estadual de Itapuã, no município de Viamão. Todas estão na área mais atingida pela tragédia de 2024.
“Essas áreas protegidas tiveram danos severos de infraestrutura e destruição de estruturas de uso público, como churrasqueiras e rampas”, explicou a Assessoria de Imprensa da Sema/RS.
O Parque Estadual de Itapuã já passou por reparos e voltou a receber turistas, neste Verão. “Todas as unidades de conservação estaduais passarão por reformas estruturais de forma concomitante”, adiantou o órgão ambiental.

Retrato antigo
O agrônomo Alexandre Krob é mestre em Ciências do Solo pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), especialista em Gestão Ambiental e coordenador Técnico e de Políticas Públicas da ong Instituto Curicaca, de Porto Alegre (RS).
Para ele, as análises governamentais sobre impactos das enchentes à biodiversidade no estado seriam mais precisas se existissem dados robustos e atualizados quanto à situação das espécies nativas antes da tragédia do ano passado.
“Seria preciso um conhecimento mais amplo sobre as populações e os ambientes naturais antes dessa nova rodada de avaliações. Ele serviria de referência comparativa com os resultados que virão nos prazos estimados”, avaliou.
Mesmo assim, o especialista espera que sejam analisados também os prejuízos do lixo, químicos e espécies invasoras nos parques e demais unidades de conservação. “Eles podem ter sido levados pelas águas e depositados nessas áreas protegidas”, alertou.