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TCU e mudanças climáticas: qual pode ser o papel do controle?

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No início de maio, o Rio Grande do Sul decretou estado de calamidade pública devido às chuvas que assolaram a região e, desde então, o assunto tem mobilizado diversos atores, inclusive o Tribunal de Contas da União (TCU).

A convite do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o atual presidente do tribunal, ministro Bruno Dantas, integrou comitiva de autoridades que foram a Porto Alegre sobrevoar as áreas atingidas. Na semana seguinte, o TCU lançou o Programa Recupera Rio Grande do Sul, voltado a acompanhar, em tempo real, a conformidade das contratações, obras e demais medidas financeiras adotadas para contornar a crise.

Além disso, o tribunal dá sinais de que irá acompanhar alternativas que vêm ganhando destaque diante da necessidade de reconstrução do RS e do enfrentamento de mudanças climáticas, como o Fundo Clima, o Plano Nacional de Proteção e Defesa Civil e a Política Nacional sobre Mudança do Clima, e outras em preparo, como o Plano de Prevenção a Desastres Climáticos.

A atuação do TCU em fiscalizações ambientais não vem de hoje e o tribunal iniciou, em março deste ano[1], planejamento de auditoria operacional voltada à redução dos riscos de desastres climáticos em ação cooperativa com a Organização Internacional das Instituições Superiores de Controle (Intosai).

Desse modo, além da fiscalização da conformidade de repasses e do uso de recursos federais, também são bem-vindos diagnósticos e sugestões oriundos de auditorias operacionais em matéria ambiental — cujo foco é avaliar a eficiência de políticas públicas, inclusive no que tange ao enfrentamento das mudanças climáticas.

Em um contexto de desafios institucionais de acompanhamento e de implementação da agenda do clima, a capacidade do tribunal de monitorar e de realizar diagnósticos é relevante e pode ser aproveitada por parlamentares, gestores e outros atores estratégicos na (re)proposição e implementação de políticas públicas.

Contudo, análises do controle de contas que entrem no mérito dessas políticas públicas não deveriam se tornar obrigatórias ao gestor.

Primeiro, porque a competência do TCU para impor medidas, via determinações, está circunscrita a matérias financeira, contábil, orçamentária e patrimonial — em política ambiental, ele não pode funcionar como revisor geral da administração.

Segundo, porque, conforme a ciência evolui, o que hoje é solução pode eventualmente deixar de sê-lo — a flexibilidade necessária para enfrentar desafios da gestão pública não parece combinar com a rigidez própria dos acórdãos.

Terceiro, porque medidas transversais e desafiadoras mobilizam diferentes pastas e níveis federativos, potencialmente escapando da alçada de jurisdicionados do tribunal.

Ainda, mesmo recomendações do tribunal tendem a ser absorvidas pelo gestor como determinações, por receio de sofrer penalidades — percepção esta que já vem sendo registrada pela literatura jurídica.[2] Neste contexto, é necessário que o TCU seja parcimonioso na análise do mérito de políticas públicas, ao passo que os achados dos relatórios contribuem mais do que as próprias decisões.

O controle da conformidade do uso dos recursos é necessário e os achados das auditorias do TCU podem ser aproveitados em políticas que visem o enfrentamento de mudanças climáticas. Em paralelo, é preciso verificar se mesmo as sugestões do tribunal acabarão sendo lidas pelo gestor como obrigatórias neste tema complexo, dinâmico e que demanda articulação em outros fóruns.


[1] Processo TC 006.390/2024-2.

[2] Nesse sentido, ver: MOTEIRO, Vera; ROSILHO, Janjácomo André. Agências Reguladoras e o Controle da Regulação pelo Tribunal de Contas da União. In: PEREIRA NETO, Caio Mario da Silva; PINHEIRO, Luís Felipe Valerim. (Coord.). Direito da Infraestrutura – Volume 2. São Paulo: SaraivaJur, 2017, p. 25-62.